segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Rainer Maria Rilke



Sobre Arte

Considero a arte o esforço de um indivíduo em chegar a um acordo com todas as coisas, as menores e as maiores, para além do estreito e obscuro e, nesses consistentes diálogos, aproximár-se das fontes últimas, silenciosas de toda vida. No interior desse indivíduo, os segredos das coisas se fundem com suas mais profundas sensações e se tornam audíveis para ele, como se fossem seus próprios anseios. A rica linguagem dessas confissões íntimas é a beleza.

Não espere que eu fale de meu esforço interior - devo me manter calado a respeito; seria aborrecido, mesmo para mim, prestar contas de todas as mudanças de fortuna que eu teria de sofrer em minha batalha por concentração. Essa inversão de todas as forças, essa mudança de direção da alma nunca ocorre sem inúmeras crises. A maioria dos artistas a evita por meio das distrações. Mas é por isso também que jamais chegam a tocar seu centro de produção, donde partiram no momento do seu mais puro elã. Toda vez, no início do trabalho, é preciso refazer para si essa inocência primeira, retornar ao local ingênuo onde o anjo se revelou a você quando lhe passou a primeira mensagem sedutora; é preciso reencontrar, por trás das amoreiras silvestres, a cama onde então se caiu no sono. Dessa vez não se irá dormir ali, mas suplicar, gemer - não importa; se o anjo se dignar  vir, será porque você o convenceu, não com lágrimas, mas com sua humilde decisão de começar sempre: ser um iniciante!