segunda-feira, 18 de julho de 2011

Gyula Krúdy




O companheiro de viagem

A cidade por fim se entristecia, como arrependida da animação que abrigara. Acima dos telhados das casas fumegava a neblina de um tédio indizivelmente triste. Das janelas, filtrava-se aqui e ali uma chama de vela, sinal de que ainda não haviam morrido todos na cidade. Mas o que fazia os vivos naquele lugar? Liam livros, contavam sempre as mesmas histórias; extasiados, sentados com os braços cruzados às costas, fitavam o vazio ou inventavam projetos liliputianos para o dia seguinte; como crianças, montavam o pinheiro ao lado das casinhas de brinquedo...

O que haveria no interior das casas que impedia as pessoas de sair correndo para as ruas, a chorar, como se despertasse a consciência de que não valia a pena viver? O que perpetuava nelas a vida e permitia que sobrevivessem às noites geladas, solitárias e tristes, quando a neve congelava sobre a janela, a escuridão era mesma dos túmulos, a cama lembrava um caixão enquanto ficavam deitadas, insones, rangendo os dentes, porque uma mosca que dormia seu sono invernal despencara do teto sobre o nariz? O que animava a espera sem sentido pela manhã? O que haveria amanhã - santa missa, casamento ou morte - em cujo nome seria digno passar às golfadas a noite gélida, longa e amarga, quando o relógio da torre mal batia as horas?  

Nenhum comentário:

Postar um comentário