quarta-feira, 29 de maio de 2013

Philip Roth




O professor do Desejo (1)

Duvidando e esperando, querendo e temendo (prevendo um futuro movimentado e agradável em determinado momento e o mais horroroso no momento seguinte), caso-me enfim com Helen Baird - após quase três anos inteiros devotados a dúvidas, esperanças, desejos e temores.  Para alguns, como meu pai, basta ver uma mulher encostada a um piano cantando "Amapola" para decidir de estalo "Lá está minha mulher", enquanto que outros suspiram "Sim, é ela" só após um interminável drama de vacilações que os conduz à conclusão inescapável de que nunca mais devem ver aquela mulher. Casei-me com Helen quando o peso da experiência necessária para chegar à decisão monumental de abandoná-la se tornou tão imenso e tão angustiante que não pude imaginar a vida sem ela. Só quando tive certeza de que aquilo precisava acabar de imediato é que descobri quão profundamente já estava casado por meus mil dias de indecisão, por todas as intrincadas avaliações de possibilidades que, sabe-se lá como, haviam feito um caso de amor de três anos parecer tão denso de eventos humanos  quanto um matrimônio de meio século. Caso-me com Helen - e ela se casa comigo - quando atingimos o momento de impasse e de exaustão que acaba chegando a todos que passam anos e anos nesses arranjos claramente demarcados e labirínticos envolvendo apartamentos separados e férias conjuntas, presunções de devoção e noites à parte preestabelecidas, casos terminados com alívio a cada cinco ou seis meses e alegremente esquecidos por setenta e duas horas, mas retomados (frequentemente com um frenesi sexual delicioso, ainda que efervescente) após um encontro mais ou menos acidental no supermercado do bairro; ou reiniciados depois de um telefonema noturno cujo o único objetivo era o de informar o ex-companheiro ou companheira que um documentário notável ia ser exibido outra vez na televisão às dez da noite; ou após um jantar a que o casal se comprometera a comparecer havia tanto tempo que agora não seria de bom-tom recusar, obrigando os dois a cumprirem essa última obrigação social juntos. Obviamente, um ou outro poderia ter se desincumbido sozinho do compromisso do jantar, mas então ficaria faltando o cúmplice com quem trocar por cima da mesa sinais de enfado ou divertimento, nem, ao voltar de carro para casa, haveria alguém com ideias afins com que fosse possível repassar os encantos e as deficiências dos outros convidados; muito menos, se despindo para dormir, haveria um amigo ávido e sorridente, deitado já nu sobre o lençol da cama, a quem pudesse dizer que a única pessoa realmente interessante na festa era o ex-parceiro ou parceira, cujo valor não fora antes corretamente apreciado.

Casamo-nos...

Um comentário:

  1. Não entendo o comentário de Debbie sobre as loiras de Kepesh, não consigo imaginar a Helen loira, você consegue?

    Ava Gardner é a minha Hellen: http://1.bp.blogspot.com/_tmOYAbNKf7w/TOwTKFwKqKI/AAAAAAAAEpI/b08URHitDZ0/s320/ava_gardnerSM.jpg

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