domingo, 1 de dezembro de 2013

Rafael R. Macêdo



[um copo de cerveja quente, um isqueiro e um cigarro]

Na escada que leva aos banheiros, um rapaz magro está parado, na altura do terceiro degrau. Blusa de algodão marrom, mangas recolhidas, listras brancas. As mãos repousam sobre o corrimão amarelo claro, preso à parede vermelha na mesma altura onde se inicia sua metade superior: um apanhado de espelhos gastos, distribuídos por ambos os lados até o teto.

No mesmo instante, mais acima, ao final do primeiro lance de escadas, uma jovem também parada. Vestido de alças azuis, jeans escuro, cobalto. A barra pela metade das coxas, grossas e resguardadas numa delicada meia-calça escura, discretamente rendada. Acaba de sair do banheiro, um tanto alta e desajeitada. Disfarça. Observa surpresa o rapaz lá embaixo. Permanece imóvel, como se congelada. 

Ele prossegue em sua direção. Sobe decidido o que lhe falta da escada. Aflita, ela arregala os olhos, confere ao lado os que passam, então sorri, respirando fundo e relaxando os ombros, como se desabrochasse. A rara combinação de malícia e ternura pela qual ele sempre se apaixonou.

Então eles se beijam com força. Francamente desesperados. Como que precipitando ali uma vontade urgente, dolorosamente condensada pelo passar dos anos. As mãos dele, dedos curtos e modestos, percorrem a pele de seu rosto macio, seu anguloso maxilar. Depois, com calma, recolhem até detrás das orelhas as mechas do seu cabelo escuro, levemente ondulados, e ainda, sorrindo, seus precoces fiapos brancos. Tudo num tamanho curto, colados ao corpo, um chanel de pontas, como se diz. 

Feito isso, ele então conforta sua nuca molhada com uma das mãos. A outra repousa esquecida, suave, sobre a cintura dela, sustentando ainda um copo de cerveja quente, o isqueiro e um cigarro de palha apagado. Tudo a um palmo de onde se começa o vestido, que lhe deixa as costas nuas, ora pressionadas, ora refletidas contra o espelho.

Pronunciam qualquer tipo de acordo, um lugar talvez, baixinho, feito prece. Ela suspira hesitante, pensa no namorado, tonta e apreensiva, no mesmo instante em que despeja lentamente seus braços magros sobre o peito dele, apoiando em seus ombros com carinho. Beijam-se mais uma vez de maneira terna, um abraço breve e íntimo como antigamente. Seguem sozinhos, em sentidos contrários. Ele, atordoado, em direção ao banheiro.

Em quarenta minutos estarão agarrados, confidentes, suados dentro de um carro, protegidos pela chuva que tomou conta da cidade enquanto tudo aconteceu. 

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